quinta-feira, 29 de janeiro de 2009

Músicas da Sangha

Inspirando, Expirando

Inspirando, expirando, inspirando, expirando
Eu floresço no jardim
Sou suave como o orvalho
Sou tão sólido quanto a montanha
E sou firme como a terra
Eu sou livre

Inspirando, expirando, inspirando, expirando
Sou espelho como a água
que reflete a realidade
E eu sinto que há espaço
bem dentro de mim
Eu sou livre, eu sou livre, eu sou livre

As duas promessas

Eu prometo desenvolver minha compreensão
a fim de viver em paz com todo mundo,
animais, plantas e minerais (2x)
hummm, ahhh, hummm, ahhh, hummm, ahhh

Eu prometo desenvolver minha compaixão
a fim de proteger a vida de todo mundo
animais, plantas e minerais (2x)
hummm, ahhh, hummm, ahhh, hummm, ahhh




A Ação Correta

Ação Correta significa Ação Correta do corpo. É a prática de entrar em contato com o amor e evitar prejudicar os outros, praticando a não-violência consigo mesmo e com outras pessoas. A base da Ação Correta é agir sempre com atenção plena.

A Ação Correta está ligada a quatro treinamentos (o primeiro, o segundo, o terceiro e o quinto) dentre os Cinco Treinamentos da Atenção Plena.

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O Primeiro versa sobre a reverência pela vida: "Cônscio do sofrimento causado pela destruição da vida, eu me comprometo a cultivar a compaixão e a aprender formas de proteger as vidas das pessoas, animais, plantas e minerais. Estou decidido a não matar, não deixar que outros matem, e não dar apoio a qualquer ato desta natureza, nem em meus pensamentos nem em meu estilo de vida."

Nós matamos todos os dias em função da forma pela qual comemos, bebemos e usamos a terra, o ar e a água. Achamos que não matamos, mas não é verdade. A Ação Correta nos ajuda a ter consciência disto, e a contribuir para o fim da matança, salvando vidas.

O Segundo Treinamento da Atenção Plena tem a ver com generosidade: "Cônscio do sofrimento causado pela exploração, injustiça social, roubo e opressão, comprometo-me a cultivar a bondade e a aprender formas de contribuir para o bem estar de pessoas, animais, plantas e minerais. Praticarei a generosidade ao compartilhar meu tempo, energia e recursos materiais com aqueles que realmente necessitem. Estou decidido a não roubar nem possuir qualquer coisa que deva pertencer a outra pessoa. Respeitarei a propriedade alheia, mas impedirei que haja o lucro de alguns com a dor humana ou com o sofrimento das outras espécies deste planeta."

Este aprendizado nos ensina a não tocar no que não é nosso e a não explorar os outros. Ele também nos incentiva a viver de forma a contribuir para a justiça e o bem estar sociais. Temos que aprender a viver com simplicidade, e não tentarmos nos apossar de mais do que nos cabe. Quando empreendemos qualquer ato que promova a justiça social, esta é uma Ação Correta.

O Terceiro Treinamento da Atenção Plena lida com responsabilidade sexual. "Cônscio do sofrimento causado pela má conduta sexual, comprometo-me a cultivar a responsabilidade e a aprender meios de proteger a segurança e a integridade de indivíduos, casais, famílias e da sociedade. Estou decidido a não ter relações sexuais sem amor e sem compromisso. Para preservar a minha felicidade e a dos outros, respeitarei os compromissos assumidos por mim e também os compromissos assumidos pelos outros. Farei tudo o que puder para proteger as crianças do abuso sexual e impedir que casais e famílias se separem devido à má conduta sexual."

A solidão não pode ser aliviada pela junção de dois corpos, a menos que também haja boa comunicação, compreensão e bondade. A Atenção Plena Correta nos ajuda a proteger os outros e a nós mesmos, inclusive as crianças, de um sofrimento maior. O mau comportamento sexual gera enorme sofrimento. Para proteger a integridade das famílias e indivíduos, agiremos sempre de forma responsável e encorajaremos os outros a fazer o mesmo. Com este aprendizado, protegeremos a nós, os que nos cercam, e toda a espécie humana, inclusive as crianças. Quando a Atenção Plena Correta irradia sua luz em nossa vida cotidiana, conseguimos manter esta prática de forma contínua.

A má conduta sexual já separou inúmeras famílias. Muito sofrimento é gerado porque as pessoas não praticam a responsabilidade sexual. Uma criança vítima de abuso sexual sofrerá por toda a sua vida. Aqueles que passaram por esta experiência podem se tornar bodhisattvas, ajudando a muitas crianças. Nossa mente amorosa pode transformar nossa dor, tornando-nos capazes de compartilhar o que aprendemos com outros. Esta é a Ação Correta, que liberta tanto a nós quanto os que nos cercam. Quando tentamos ajudar os que estão ao nosso redor, ajudamos também a nós mesmos.

O Quinto Treinamento da Atenção Plena nos incentiva a comer, beber e consumir conscientemente. Ele está vinculado às Quatro Nobres Verdades e a todos os elementos do Nobre Caminho Óctuplo, em especial à Ação Correta: "Cônscio do sofrimento causado pelo consumo inconsciente e desatento, comprometo-me a cultivar a boa saúde, tanto física como mental, em mim, em minha família e na sociedade, tendo consciência do que irei comer, beber e consumir. Comprometo-me a ingerir apenas coisas capazes de preservar a paz, o bem-estar e a alegria de meu corpo e minha consciência, bem como do corpo e da consciência da família e sociedade. Tenho a firme intenção de não usar álcool ou outros intoxicantes, nem ingerir alimentos ou praticar diversões que contenham toxinas, como por exemplo certos programas de TV, revistas, livros, filmes e conversas. Sei que ao contaminar meu corpo ou minha consciência com estes venenos estou traindo meus ancestrais, meus pais, minha sociedade e as gerações futuras. Comprometo-me a trabalhar para transformar a violência, o medo, a raiva e a confusão existentes dentro de mim e na sociedade, praticando uma dieta que ajuda a mim e também à sociedade. Compreendo que uma boa dieta é fundamental para a transformação do indivíduo e da sociedade."

Ação Correta significa fornecer ao corpo e à mente apenas nutrientes sadios e seguros. Ao comer e beber de modo consciente, evitamos tudo o que possa gerar toxinas, bem como álcool ou drogas, tanto em nível individual quanto familiar e social. Vamos consumir sempre com consciência, para que a vida se torne melhor para todos. Praticaremos o consumo consciente para proteger nosso corpo e nossa mente da ingestão de toxinas. Certos programas de televisão, livros, revistas e conversações têm o dom de introduzir a violência, o medo e o desespero em nossas consciências. Precisamos praticar o consumo consciente para proteger o corpo, a mente, e também a família e a sociedade.

Quando nos propomos a não beber álcool, estamos nos protegendo mas também estamos protegendo a família e a sociedade. Uma mulher de Londres me disse: "Venho bebendo dois copos de vinho por dia há mais de vinte anos, e isso nunca me fez mal. Por que deveria abandonar este hábito?" Eu respondi: "É verdade que dois copos por dia não lhe fazem mal, mas como sabe que isso não prejudica seus filhos? Você pode não ter o gene do alcoolismo, mas talvez um dos seus filhos o tenha. Se abandonar o vinho fará um favor não só a si mesma, mas aos seus filhos e à sociedade." Ela compreendeu, e na manhã seguinte recebeu formalmente os Cinco Treinamentos da Atenção Plena. Esse é o trabalho de um bodhisattva, fazer as coisas não por si mesmo, mas por todas as outras pessoas.

O Ministério da Saúde francês aconselha as pessoas a não beber demais. Eles anunciam na televisão: "Um copo não faz mal, mas três copos são um convite para o desastre." Eles querem que as pessoas sejam moderadas ao beber. Mas se o primeiro copo não for bebido, não haverá o terceiro. Evitar o primeiro copo é a melhor proteção que existe, porque você protege a si mesmo e todos nós ao mesmo tempo. Quando consumimos conscientemente, estamos protegendo nosso corpo e mente, bem como o corpo e a mente da família e da sociedade. Sem o Quinto Treinamento da Atenção Plena, como poderemos melhorar nossa sociedade? Quanto mais consumirmos, mais sofreremos, e mais faremos os outros sofrerem. O consumo consciente parece ser a única forma de sair dessa situação, fazendo cessar a destruição de nossos corpos,. nossas mentes bem como do corpo e da mente sociais.

Observando com profundidade, enxergamos a natureza intercambiável dos Cinco Treinamentos da Atenção Plena e do Nobre Caminho Óctuplo. Usamos a Atenção Plena Correta para verificar se nossa comida, bebida e consumo estão de acordo com a Ação Correta. Tanto a Compreensão Correta quanto o Pensamento Correto e a Fala Correta precisam estar presentes para que possamos praticar o Quinto Treinamento da Atenção Plena. Os Cinco Treinamentos da Atenção Plena são interpenetrados por todos os elementos do Nobre Caminho Óctuplo, em especial a Ação Correta.

A Ação Correta se baseia na Compreensão Correta, no Pensamento Correto e na Fala Correta, e depende do Meio de Vida Correto. Aqueles que ganham o seu sustento fabricando armas, tirando a oportunidade de os outros viverem, destruindo o meio ambiente, explorando a natureza ou as pessoas, ou fabricando coisas que produzem toxinas, talvez ganhem muito dinheiro, mas estão praticando o meio de vida errôneo. Temos que estar conscientes para podermos evitar as ações incorretas. Se não tivermos a Compreensão Correta, o nosso esforço pode estar produzindo resultados não desejados.

Um mestre experiente só precisa observar o praticante caminhando ou tocando um sino para saber quanto tempo ele está na prática do caminho. O mestre observa a Ação Correta do praticante e vê todas as outras etapas que estão contidas nela. Assim também, se observarmos com atenção uma pessoa em relação a uma etapa do caminho, podemos avaliar a sua realização em relação às demais etapas.

Existem muitas coisas que podem ser feitas para se praticar a Ação Correta. Por exemplo, proteger vidas, praticar a generosidade, comportar-se de forma responsável e consumir conscientemente. A base da Ação Correta é a Atenção Plena Correta.

(Do livro “A Essência dos ensinamentos de Buda” – Thich Nhat Hanh)

terça-feira, 27 de janeiro de 2009

Diferentes tipos de amor

O Rei Pasenadi olhou para o Buda. Ele ficou impressionado. O Buda falou com voz calma e quieta e o que disse foi ao mesmo tempo simples e profundo. O rei sentiu que podia confiar no Buda e então perguntou o que o estava angustiando.

“Mestre Gautama, há pessoas que dizem que você aconselha as pessoas a não amarem. Eles dizem que, quanto mais uma pessoa ama, mas sofrerá e se desesperará. Posso ver alguma verdade nessa afirmativa, mas não consigo encontrar paz com ela. Sem amor, a vida pareceria vazia de significado. Por favor, me ajude a resolver isso.”

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O Buda olhou para o rei de forma acolhedora. “Majestade, sua questão é muito boa, e muitos podem se beneficiar dela. Há muitos tipos de amor. Deveríamos examinar em detalhes a natureza de cada tipo de amor. A vida tem grande necessidade da presença de amor, mas não do tipo de amor que é baseado na luxúria, paixão, apego, discriminação e preconceito. Majestade, há outro tipo de amor, extremamente necessário, que consiste de bondade amorosa e compaixão, ou maitri e karuna.”

“Usualmente quando as pessoas falam de amor elas se referem apenas ao amor que existe entre pais e filhos, maridos e esposas, membros da família, casta ou país. Devido à natureza deste amor depender do conceito de ‘eu’ e ‘meu’, ele permanece misturado com apego e discriminação. As pessoas querem apenas amar seus pais, esposos, filhos, netos, seus parentes e compatriotas. Como são capturados pelo apego, eles se preocupam com acidentes que podem acontecer a seus amados mesmo antes deles ocorrerem. Quando esses acidentes ocorrem, eles sofrem terrivelmente. O amor que é baseado na discriminação produz preconceito. As pessoas se tornam indiferentes ou mesmo hostis àqueles fora de seu círculo de amor. Apego e discriminação são fontes de sofrimento para nós mesmos e para os outros. Majestade, o amor pelo qual todos os seres estão verdadeiramente famintos é a bondade amorosa e a compaixão. “

“Maitri é o amor que tem a capacidade de levar felicidade para outro. Karuna é o amor que tem a capacidade de remover o sofrimento do outro. Maitri e karuna não exigem nada em troca. Bondade amorosa e compaixão não estão limitadas aos pais, esposos, filhos, parentes, membros da casta e compatriotas. Eles se estendem a todas as pessoas e todos os seres. Em maitri e karuna não há discriminação, não há ‘meu’ e ‘não meu’. E como não há discriminação, não há apego. Maitri e karuna trazem felicidade e aliviam o sofrimento. Eles não causam sofrimento ou desespero. Sem eles, a vida seria vazia de significado, como você disse. Com bondade amorosa e compaixão, a vida é preenchida de paz, alegria, e contentamento. Majestade, você é o dirigente de todo um país. Todas as pessoas se beneficiariam de sua prática de bondade amorosa e compaixão.”

O rei inclinou sua cabeça, pensando. Ele olhou ao Buda e perguntou, “Eu tenho uma família para cuidar e um país para dirigir. Se eu não amasse minha família e povo, como poderia cuidar deles? Por favor, esclareça para mim.”

“Naturalmente você deve amar sua própria família e povo. Mas seu amor pode também se estender para além de sua família e povo. Você ama e cuida do príncipe e da princesa, mas isso não o impede de amar e cuidar de outros jovens no reino. Se puder amar todos os jovens, seu amor atual, que é limitado, se tornará um amor inclusivo e todos os jovens do reino serão seus filhos. Isto é o que significa ter um coração de compaixão. Não é apenas um ideal. É algo que pode ser realizado, especialmente por alguém como você que tem tantos meios à disposição.”

“Mas e sobre os jovens dos outros reinos?”

“Nada o impede de amar os jovens de outros reinos como se fossem seus filhos mesmo que eles não habitem sob sua jurisdição. Apenas porque alguém ama seu povo não é razão para não amar povos de outros reinos.”

“Mas como posso mostrar meu amor por eles se não estão sob minha jurisdição?”

O Buda olhou para o rei. “A prosperidade e segurança de uma nação não deveriam depender da pobreza e insegurança das outras nações. Majestade, paz duradoura e prosperidade são apenas possíveis quando as nações se juntam em um comprometimento comum para procurar o bem estar de todos. Se você quer que Kosara realmente desfrute de paz e que os jovens do seu reino não percam a vida nos campos de batalha, você deve ajudar aos outros reinos a achar paz. As políticas externas e econômicas devem seguir o caminho da compaixão para a paz verdadeira ser possível. Ao mesmo tempo, enquanto você ama e cuida de seu próprio reino, você pode amar outros reinos como Magadha, Kasi, Videha, Sakya e Lokya.”

“Majestade, no ano passado eu visitei minha família no reino de Sakya. Eu descansei muitos dias em Arannakutika aos pés do Himalaya. Lá eu fiquei muito tempo refletindo sobre uma política baseada na não-violência. Eu vi que nações podem de fato desfrutar de paz e segurança sem ter que recorrer a métodos violentos tais como prisões e execuções. Eu falei dessas coisas ao meu pai, rei Suddhodana. Agora eu aproveito essa oportunidade para dividir as mesmas idéias com você. Um dirigente que nutre sua compaixão não precisa depender de meios violentos.”

O rei exclamou, “Maravilhoso! Verdadeiramente maravilhoso! Suas palavras são as mais inspiradoras! Você verdadeiramente é o iluminado! Eu prometo refletir em tudo o que disse hoje. Eu penetrarei em suas palavras, que contêm muita sabedoria. Mas por agora, por favor, permita-me perguntar uma questão simples. Ordinariamente, amor realmente contém elementos de discriminação, desejo e apego. De acordo com você, este tipo de amor cria preocupação, sofrimento e desespero. Como pode alguém amar sem desejo e apego? Como posso evitar criar preocupação e sofrimento no amor que sinto pelos meus filhos?”

O Buda respondeu, “Nós precisamos olhar para a verdadeira natureza de nosso amor. Nosso amor deveria trazer paz e felicidade aos que amamos. Se nosso amor é baseado em um desejo egoísta de possuir outros, não seremos capazes de levar até eles paz e felicidade. Ao contrário, nosso amor os fará se sentirem em uma armadilha. Tal amor não é mais que uma prisão. Se as pessoas que amamos são incapazes de serem felizes devido ao nosso amor, eles acharão uma maneira de se libertar. Não aceitarão a prisão do nosso amor. Gradualmente o amor entre nós se tornará raiva e ódio.”

“Majestade, você ouviu a tragédia que aconteceu dez dias atrás em Savatthi devido ao amor egoísta? A mãe sentiu que tinha sido abandonada pelo seu filho quando ele se apaixonou e casou. Ao invés de se sentir como se houvesse ganho uma filha, ela apenas sentiu que havia perdido seu filho e se sentiu traída por ele. Por isso, seu amor se tornou ódio e ela pos veneno na comida do jovem casal matando ambos.”

“Majestade, de acordo com o Caminho da Iluminação, amor não pode existir sem entendimento. Amor é Entendimento. Se você não pode entender, não pode amar. Maridos e esposas que não se entendem, não se amam. Irmãos e irmãs que não se entendem, não se amam. Pais e filhos que não podem se entender, não podem se amar. Se você quer que seus amados sejam felizes, você deve aprender a entender seus sofrimentos e suas aspirações. Quando você entende, saberá como aliviar seus sofrimentos e como ajudá-los a tornar realidade suas aspirações. Isto é verdadeiro amor. Se você quer apenas que seus amados sigam suas próprias idéias e ignora suas necessidades, não é um verdadeiro amor. É apenas desejo de possuir o outro e uma tentativa de atender às suas próprias necessidades, que não podem ser preenchidas deste modo.”

“Majestade, o povo de Kosala tem sofrimentos e aspirações. Se você não puder entender esses sofrimentos e aspirações, não será capaz de verdadeiramente amá-los. Todos os oficiais de sua corte têm sofrimentos e aspirações. Entenda esses sofrimentos e aspirações e descobrirá como ser capaz de dar-lhes felicidade. Graças a isto, eles se manterão leais a você por toda vida. A rainha, o príncipe e a princesa têm seus próprios sofrimentos e aspirações. Se você puder entendê-los, será capaz de trazer-lhes felicidade Quando cada pessoa desfruta de felicidade, paz e alegria, você mesmo conhecerá felicidade, paz e alegria. Este é o significado do amor de acordo com o Caminho da Iluminação.”

O rei Pasenadi estava profundamente emocionado. Nenhum outro mestre espiritual ou padre brâmane alguma vez abriu a porta de seu coração e permitiu a ele entender as coisas tão profundamente. A presença deste mestre, ele pensou, era de grande valor ao país. Ele queria ser um estudante do Buda. Depois de um momento de silêncio, ele olhou ao Buda e disse, “Eu te agradeço por jogar tanta luz sobre essas questões para mim. Mas há uma coisa que permanece ainda me aborrecendo. Você disse que o amor baseado no apego e desejo cria sofrimento e desespero, enquanto o amor baseado na compaixão traz apenas paz e felicidade. Mas ainda assim eu vejo que o amor baseado no caminho da compaixão mesmo não sendo egoísta ainda pode trazer dor e sofrimento. Eu amo meu povo. Quando eles sofrem devido a algum desastre natural como um tufão ou enchente, eu sofro também. Eu tenho certeza que se passa o mesmo com você. Certamente você sofre quando você vê alguém doente ou morrendo.”

“Sua questão é muito boa. Graças a esta pergunta você poderá entender mais profundamente a natureza da compaixão. Primeiramente, você deveria saber que o sofrimento causado por um amor baseado no desejo e no apego é milhares de vezes maior que o sofrimento que resulta da compaixão. É necessário distinguir entre os dois tipos de sofrimento – um que é inteiramente inútil e serve apenas para perturbar nossa mente e corpo e o outro que nutre a capacidade de cuidar e a responsabilidade. O amor baseado na compaixão pode prover a energia necessária para responder aos sofrimentos dos outros. O amor baseado no apego e desejo pode apenas criar ansiedade e mais sofrimento. Compaixão provê o combustível para ações que ajudam e para o serviço. Grande rei, compaixão é extremante necessária. A dor que resulta da compaixão pode ser uma dor útil. Se você não pode sentir a dor da outra pessoa, não é realmente humano.”

“Compaixão é o fruto do entendimento. Praticar o Caminho da Consciência é perceber a verdadeira face da vida. Esta verdadeira face é impermanência. Tudo é impermanente e sem um eu separado. Tudo deve um dia se extinguir. Um dia seu próprio corpo se extinguirá. Quando uma pessoa vê dentro da natureza impermanente de todas as coisas, seu modo de olhar se torna calmo e sereno. A presença da impermanência não perturba seu coração e mente. E, portanto os sentimentos de dor que resultam da compaixão não carregam a amarga e pesada natureza que outros tipos de sofrimento fazem. Pelo contrário, compaixão dá a pessoa grande força. Grande rei, hoje você ouviu algumas doutrinas básicas do Caminho da Libertação.”

(Do livro “Old Path White Clouds” sobre a vida do Buda – Thich Nhat Hanh)
(Traduzido por Leonardo Dobbin)

segunda-feira, 26 de janeiro de 2009

A Tradição Budista Thien Lam-Te

A TRADIÇÃO BUDISTA THIEN LAM-TE - UM RAMO DE UMA ÁRVORE ANTIGA

O mestre Thich Nhat Hanh pertence a uma linha de transmissão do Budadharma que teve suas raízes plantadas no Vietnã, no séc. III d.C, mas que remonta ao budismo originário, tanto Mahayana quanto Theravada, vindos do Buda Sakyamuni.

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Dentre a tradição indiana de meditação (dhyana em sânscrito, thien em vietnamita, zen em japonês, e ch'an em chinês) Mahayana, da qual se nota a principal influência, tanto no Cânone chinês quanto na tradição vietnamita, são a Sarvativada e a Yogachara ou Vijnanavada. A Sarvativada, de origem Theravada, surgiu durante o reinado do rei Ashoka (272-236 a.C.) vinda da Escola Sthavira (fruto por sua vez da primeira divisão da Sangha, durante o Concílio de Pataliputra, no séc.IV a.C.).

A Escola Sarvativada, cujo cânone foi transmitido em sânscrito e traduzido para chinês e tibetano, línguas nas quais tem estado preservado, sustentava que o passado, o presente e o futuro existem no mesmo instante. Sua obra básica, o Abhidharmakosha, compilado em 600 versos por Vasubandhu, o 21º patriarca do Budismo, no séc. V, representa a mudança da Tradição Theravada para a Mahayana.
Vasubandhu e seu irmão Assanga fundaram a Escola Mahayana Vijnanavada, e segundo ela, "tudo é apenas mente", não se podendo sustentar ser o objeto distinto do sujeito. A percepção "é um processo da imaginação criativa que produz a aparência dos objetos externos". Tal processo é explicado com a ajuda do conceito de "consciência armazenadora", alayavijnana, na qual estão presentes todas as sementes (bija) da formação mental e que continuam a fluir, como um rio, de existência a existência.

A Escola Yogachara alcançou seu apogeu no séc. VI. O centro de estudo mais famoso foi a Universidade de Nalanda, no norte da Índia. O Sutra Lankavatara é a referência desta escola, no qual é enfatizada a iluminação que elimina toda dualidade possível de atrapalhar a compreensão da natureza búdica presente em todos os seres, o tathagatagarbha. Com esta fonte de ensinamentos fica-se de acordo com os da Escola Theravada do Sri Lanka, cujos mestres chegaram ao Vietnam através do Camboja e do Laos, sobre tudo nos últimos 200 anos. Esta união representa um caso único no mundo, quem afirma é o mestre Thich Nhat Hanh em seu livro "História do Budismo Vietnamita".

O primeiro patriarca do budismo thien foi o mestre Tang Hoi. Originário do norte do país, Tang Hoi fez o comentário aos sutras referentes ao budismo original, como o Anapananusmrti (título sânscrito do sutra da Plena Consciência à Respiração) com uma visão mahayana. Entre os seus célebres comentários há também os sobre Os Oito Mil Versos do Prajnaparamita. No Vietnam, Tang Hoi difundiu a doutrina do vazio e escreveu a "Antologia das seis virtudes trancendentais". Depois partiu para o reino Wu, na China meridional, onde construiu o primeiro templo budista. Na China Tang Hoi permaneceu por trinta e três anos, até a sua morte. Somente 200 anos depois, em 580, o 21º patriarca do budismo originário, Bodhidharma, começou a difundir na China os ensinamentos dhyana da qual germinaria a tradição Ch'an.

"A plena consciência da respiração - escreveu o mestre Tang Hoi no prefácio do Comentário sobre o Anapananusmrti Sutra - é o grande veículo usado por todos os Budas para salvar os seres que estão lutando e submerso no oceano do sofrimento". Tang Hoi ensinava a meditação como sendo o método para "eliminar um milhão e trezentos mil pensamentos nocivos que enchem nossa mente dia e noite, sem estarmos conscientes disso". E explicava que por "voltar" se entende, o ingresso da mente a um estado de plena consciência e de "purificação" dos pensamentos insanos sem o que ela não fica "limpa", livre das percepções errôneas.

No séc. III, Kalasivi, outro mestre de Tongking, traduziu o Sutra Saddharmasamadhi e no ano 450, ainda em Tonking, chegou da Índia Dharmadeva, mestre de tradição mahayana, com seu aluno vietnamita, Hue Thang, ensinou meditação baseando-se no Sutra do Lótus. Logo após, três escolas budistas chinesas começaram a influenciar a tradição budista do Vietnã.

Particularmente importante foi a escola do mestre Vinitaruci (séc. VI), inspirada no Tantrayana, e a do mestre Vo Ngon Thong (séc. IX), baseada na doutrina da Iluminação Súbita e do Não Apego. O chefe da segunda escola, o chinês Pai Chang (720-814), sublinhou a importância de se combinar a meditação sentada com o trabalho monástico. Famoso por seu ditado: "Um dia sem trabalho, um dia sem comida". Estas duas escolas marcaram profundamente o desenvolvimento sucessivo do budismo no Vietnã. Dessas, realmente, foi fonte de inspiração, no séc. XII, a Escola do Bosque de Bambu, do mestre Hien Quang.

No período histórico durante o qual o Vietnã teve que enfrentar as tentativas de invasões por parte dos mongóis, o budismo floresceu como nunca e alcançou sua idade de ouro. Hien Quang transmitiu o Dharma ao rei Tran Thai Tong e depois a um importante professor, Tue Trung, irmão mais velho do rei Tran Nhan Tong, que defendeu Tongking dos ataques do exército mongol em 1284 e 1287.

Tran Thai Tong (1218-1277) abdicou em favor de seu filho quando tinha 41 anos, e passou a se dedicar totalmente a prática e a escrever suas duas obras: "Guia do Zen" e "Lições sobre a Vacuidade", esta última encontra-se traduzida por Thich Nhat Hanh no seu livro "Uma Chave para o Zen". Tran Nhan Tong, outro que além de soberano e de herói nacional, foi também patriarca e grande mestre da Escola do Bosque de Bambu, a qual deu a primeira ordenação sistemática.

Todos esses ensinamentos foram influenciados pela escola chinesa fundada pelo mestre Lin-chi (Rinzai em japonês e Lam-Te em vietnamita), que introduziu novos meios hábeis, como o kung an (cong an em vietnamita, e Koan em japonês) e ao uso do grito repentino Oh! após o golpe do kyosaku (o bastão símbolo da espada da sabedoria do Bodhisattva Manjushri, que quebra toda ilusão, e utilizado para encorajar os meditadores - não para puni-los - durante as seções intensivas de meditação).
Durante a dinastia Tran, que durou até o ano1400, o Vietnã era um país unido e forte. O budismo difundia como nunca e entre 1295 e 1319 foram escritos mais de 50 mil livros, uma edição do Tripitaka e muitas outras obras. A Escola do Bosque de Bambu ordenou entre os anos 1300 e 1329 cerca de 15 mil monges e monjas.

A invasão chinesa da disnastia Ming no início do séc. XV marcou o princípio do declínio do budismo vietnamita. A independência foi obtida novamente somente após 25 anos, quando cerca de 90% dos textos tinham sido destruídos. Para não falar da discriminação dos neoconfuncianos nos confrontos com os budistas, que continuou por muito tempo. Dois séculos mais tarde, quando foi extinta a dinastia Ming, muitos monásticos chineses mestres das Escolas Lin-chi e Ts'ao-tsung (Soto em japonês), refugiaram-se no Vietnã. O budismo tornou a florir, ao ponto de, entre outras, se desenvolveu a escola do mestre Lieu Quan (1670-1742), aluno rinzai e soto, que tornou-se uma das mais importante do país.

No século XX a história do budismo no Vietnã se entrelaça com acontecimentos sociais e políticos particularmente dolorosos: a invasão francesa (devida a qual foi reforçada a religião católica) 100 anos após a unificação do país; a resistência armada e a introdução do comunismo; o regime filo-ocidental do presidente Ngo Dinh Diem (que aboliu a festa nacional do Vesak e causando o protesto em praça pública de monges e monjas budistas, alguns dos quais se imolaram vivos); a longa e desgastante guerra entre viet-cong e americanos, terminada com o Tratado de Paris em 1975, a qual deu sua contribuição a delegação budista presidida pelo mestre Thich Nhat Hanh.
Logo depois da queda da ditadura de Diem, em 1963, as organizações budistas fundaram a Igreja Budista Unida (CBU), a qual aderiram as Escolas Mahayana e Theravada. Em 1964 surgiram o Instituto Budista An Quang e a Universidade Van Hanh, das quais o mestre Thich Nhat Hanh foi co-fundador. A intenção desses centros era o de garantir os estudos a estudantes das tradições quer Mahayana, quer Theravada. Onze anos mais tarde, logo após a entrada no poder do governo comunista, os monges e monjas da Igreja Budista Unida começaram a sofrer severa repressão.

Além disso, os dirigentes de Hanói fundaram em 1980 uma Igreja Budista Estatal, excluindo a Igreja Budista Unida (CBU). Ainda hoje os expoentes mais idosos e importantes da Igreja Budista Unida estão em prisões, não obstante as tentativas de intercessão colocado no ato de Organizações Humanitárias como da Anistia Internacional.

Thich Nhat Hanh, foi exilado nos fins dos anos 60 (em sua pátria seus livros circulam com selo clandestino), e, então, por isso, é o único mestre da Tradição Thien que pode transmitir os ensinamentos. Seu nome de Dharma completo é Mestre de Dhyana Trung Quang Nhat Hanh, da 42ª geração da Escola de Dhyana Lam-Te e da 9ª geração da linhagem Lieu Quan do Dharma.

As Cinco Contemplações

(Ensinamentos lido nos monastérios de Thich Nhat Hanh, em todos os encontros de nossa Sangha e diariamente, em nossos lares ou antes de realizarmos nossas refeições)

Este alimento é presente de todo o Universo. Ele veio da terra, do céu, de numerosos seres vivos e de muito trabalho árduo.

Que possamos comê-lo em plena consciência e com gratidão a fim de sermos dignos de recebê-lo.

Que possamos reconhecer e transformar nossas formações mentais não saudáveis, principalmente nossa ganância, e aprendermos a comer com moderação.

Que possamos manter nossa compaixão viva através de uma alimentação que alivie o sofrimento dos seres vivos, preserve nosso planeta e reverta o processo de aquecimento global.

Aceitamos este alimento para que possamos nutrir nossa irmandade, fortalecer nossa sangha e cultivar nosso ideal de servir a todos os seres.